quarta-feira, 27 de janeiro de 2021

Vamos falar de horários de sono?

Vamos sim senhor. E perdoem-me se disser alguma bacorada, especialmente em contexto científico, mas já tenho 50mg de trazodona e 6mg de diazepam no bucho há umas boas duas horas e já nem consigo articular vocábulos.

Uma boa higiene do sono é a base para a recuperação ou estabilização de qualquer doença mental. No caso dos bipolares, como eu, a necessidade de dormir varia conforme o nosso estado: num episódio depressivo podemos ultrapassar as 12 horas de sono diárias e sentir que não foram suficientes, enquanto num episódio maníaco/hipomaníaco podemos dormir apenas 2 horas ou passar a noite em branco e sentir que temos toda a energia do mundo. Acreditem em mim quando digo que as duas únicas "directas" que fiz na vida foram durante episódios hipomaníacos e passaram 40 horas antes de sentir cansaço e necessidade de dormir.

O ideal, de facto, é dormir as cerca de 8 horas diárias durante a noite, mas nem toda a gente funciona desta forma. Cada pessoa tem o seu cronótipo, o seu próprio relógio biológico programado para funcionar de uma certa forma. Geralmente dividem-se entre pessoas "diurnas", os "early birds", que dormem durante a noite e acordam de manhã cedo, atingindo um pico de produtividade na primeira metade da jornada, e os "nocturnos", os "night owls", que geralmente ficam a pé até tarde por serem mais produtivos durante a noite, e acabam por dormir a manhã inteira. No entanto, há pessoas que conseguem funcionar das duas formas, e outras que não se enquadram em nenhum destes padrões.

Eu descobri, há uns 4 ou 5 anos, que se me deitar todos os dias às 22h acordo naturalmente às 6h, sem alarmes. Ajuda se durante a noite tiver alguma janela disponível para que de manhã a luz entre pelo quarto, tornando o acordar mais natural de um ponto de vista biológico. Aprecio em particular não precisar de alarmes para acordar, porque o sobressalto de ouvir um alarme deixa-me ansiosa, mas noto imensas diferenças entre um horário de sono forçado e um horário de sono natural.

Um ciclo de sono dura em média 90 minutos, e é mais fácil e saudável acordar no final de um ciclo em vez de os interromper. Assim, em teoria, dormir 7 horas e 30 minutos seria o ideal, mas nem sempre é assim: no meu caso em particular preciso das 8 horas completas até o meu corpo acordar naturalmente.

Mas eu preciso (ou gosto) de acordar às 6h todos os dias? Não. É bonito ver o sol nascer às vezes, mas não é algo que queira todos os dias, além de ficar desfasada das outras pessoas com quem coabito. Posso ter a mesma experiência ao acordar às 9h como faço agora ou a outra hora que queira, desde que adormeça 8 horas antes. Para isto funcionar está implícito que se mantém este horário de sono todos os dias, incluindo fins-de-semana e feriados em que gostamos de ficar na caminha até mais tarde ou aquelas noites de sexta-feira que se tornam mais longas através do convívio com os amigos.

Uma das soluções para tratar um episódio depressivo ou maníaco/hipomaníaco é precisamente contrariar os horários de sono que vêm com esses episódios. Não é fácil e não se consegue de um dia para o outro, mas não é impossível, só requer disciplina (ugh) e força de vontade.

Porque é que estou aqui hoje a falar disto? Porque estou a recuperar de um episódio depressivo que está a interferir com o meu sono e decidi deitar-me mais cedo, antes da meia-noite. Entre não conseguir adormecer e a proactividade que veio com a medicação nova, estive aqui entretida com sudokus e a escrever isto e já são 2h da manhã.

Eu disse que não era fácil...

sábado, 23 de janeiro de 2021

Eu não estou bem,

e claramente, lendo tudo isto em retrospectiva, nunca estive.

Bipolar sneaks around you e quando pensas que a controlaste estás enganado.

Apanha-te de surpresa, atrai-te para o teu novo projecto que parece uma lufada de ar fresco, um novo começo, a fresh start. E tu cumpres, sem te aperceberes arranjas desculpas que fazem com que tudo pareça uma óptima ideia no grande plano que se avizinha, e pões tudo em marcha.

"Eu estou bem."
"Eu consegui fazer isto tudo."
"Eu fiz o que tinha de ser feito."

"Tudo o que fiz parece hipomania, mas não me pus em perigo nem tive gastos excessivos e este cansaço parece mais depressão do que mania."

I was wrong.

Eu fugi das minhas responsabilidades e das pessoas tóxicas com quem não queria lidar.
Eu procurei refúgio num lugar onde ninguém me conhecia, ninguém me procurava, com a ilusão de que o tempo neste novo lugar estava parado à minha espera, à espera que eu estivesse pronta para retomar a minha vida.
Eu gastei o dinheiro de outra pessoa para concretizar este plano, e saí do único lugar a que consigo chamar Casa, depois de 25 anos a evitar fazê-lo, recusando propostas de estudo e trabalho promissoras, em prol do meu bem-estar na minha Terra Mãe, onde estão as minhas raízes.

Fiz tudo isto sem me aperceber de nada. E depois bati no fundo. O cansaço apoderou-se de mim, vi a escuridão, o meu primeiro amor, e senti-a a chamar-me. E deixei que me abraçasse, pela primeira vez em anos. Às vezes via-a à distância, deixava-a bater à porta mas não lha abria. Desta vez deixei-a entrar, com um sentimento de saudade e nostalgia poderoso, quite bittersweet.

Enganei-me a mim própria. E agora tenho de arcar com as consequências.

sábado, 6 de fevereiro de 2016

Ajuda da medicação...?

Ao contrário do que possam pensar, não piorei nem estou caída a um canto. As coisas têm estado a correr bem, dentro do minimamente aceitável. Estou a levar um estilo de vida que se pode considerar normal.

A medicação ajuda muito, sim. Muitas melhorias na minha vida.

Mas não, não voltou nem de longe àquilo que era.

terça-feira, 19 de janeiro de 2016

Rage

Não tinha um acesso de raiva há muito tempo. Não sei o que se passou ao certo, mas ainda bem que consegui controlar. A minha vontade era empurrar a mesa onde estávamos sentados contra a pessoa em questão e perguntar-lhe se se importava de calar ou preferia levar um murro nas trombas. Até pesquisava um bocado para perceber ao certo o que despoleta estes picos de raiva, mas tenho um artigo para escrever. Só achei que a escrita aqui era muito mais fácil por isso vim gastar tempo.

Beijinhos e abraços.

domingo, 17 de janeiro de 2016

Pesadelos

Retiro algumas coisas que disse nos últimos dias. Os pesadelos não param. Os pesadelos continuam. E aparecem quando menos espero. Continuo a ser atormentada com pessoas que odeio a matar as pessoas que mais amo. Pessoas que odeio a roubar-me e a "converter" as pessoas que mais amo, a levá-las a revoltar-se contra mim.

Chega a ser irónico isso acontecer, quando uma das pessoas que mais amo está nesses momentos a dormir em paz mesmo ao meu lado, e eu já tenho um nível de confiança que me deveria garantir a mim e ao meu subconsciente que ele não vai a lado nenhum, ninguém lhe vai fazer mal, e nunca vai deixar de gostar de mim por mandamento de outra pessoa.

Sinto-me como o Scott Pilgrim a lutar contra os 7 evil EXs da Ramona Flowers, e às vezes preciso que seja ela a lutar por mim porque é demasiado para eu conseguir.

Mas metáforas à parte, falar do drama da minha vida amorosa parece um bocadinho greedy para esta plateia. A questão é que este é um dos pilares fundamentais da minha vida, e a dor que já causou em tão pouco tempo põe em causa o meu bem-estar físico e consequentemente o meu tratamento. E mesmo quando acordo e não me lembro exactamente do que sonhei, como aconteceu hoje, a dor está lá, e magoa... magoa tanto. E aposto que também o magoa a ele por me ver assim, mesmo sabendo que ultimamente já tenho sentido a certeza de que a culpa desta dor, de facto, não é dele.

sábado, 16 de janeiro de 2016

É estranho

Começo a achar que tudo isto é o produto de um esgotamento ao fim de 10 anos de crescimento em que fui forçada a ser mãe, irmã, mulher, dona de casa, e adulta. Ao longo de 10 anos ganhei quase todas as ferramentas que uma pessoa precisa para fazer uma vida... mas perdi as que já tinha. Confiança, segurança, capacidade de saber o que fazer e quando o fazer.

E por isso acho muito estranho estar a ser capaz de lidar com todos os aspectos da minha vida tão bem. Não me sinto assim tão controlada há muito tempo. Tenho medo que esta estabilidade desapareça de um momento para o outro, como acontece sempre que tudo está a correr bem. Não sei se estou com sorte ou se realmente o tratamento recomeçou a funcionar, mas gostava de poder ficar descansada quanto a isto. Ansiedade, um bocadinho, mas sob controlo e sem medicação.

I'm proud of myself.

sexta-feira, 15 de janeiro de 2016

Comprimidos

Gosto muito de vocês mas gostava que fossem menos, mais baratos, e que não precisasse de ir ao médico pedir papéis para vos ter.

Vamos focar-nos no positivo

O que diz no título. Cenas positivas.

3 aspectos fundamentais da minha vida, os pilares:

Família
Está tudo uma merda. Não me sinto aceite, embora saiba que nem tudo é assim tão mau, tendo em conta que tenho o meu cantinho, o meu quarto no meu apartamento partilhado, e tenho o meu gato comigo. O meu pai continua sem compreender a doença ano e tal depois. Percebe, mas não compreende. O meu irmão, das duas uma: ou sai igual ao meu pai ou se revolta contra tudo e todos. E não há nada que possa fazer para contrariar isso, visto que sair de casa não foi suficientemente drástico.

Amores
Tenho uma pessoa que me compreende, que tem paciência para os meus dramas de doente e para os meus dramas de comum mortal. Foi difícil, tive de lutar, esperar, sofrer. Mas que está a valer a pena, isso está. Ele não é perfeito, pelo contrário, como lhe disse uma vez, tem mais defeitos do que muita gente que conheço. A forma como ele luta contra eles e os consegue vencer é o que faz dele perfeito.

Estudos
Acabei a recolha de dados do laboratório, agora é escrever e ler muitos artigos. Não me lembro se alguma vez cheguei a falar disto aqui, mas estou a trabalhar em colaboração com o pessoal da Psicologia. Acho que é a porta para aquilo que de momento mais quero estudar, que são as doenças mentais. Também me inscrevi num exame para fazer melhoria. Apesar de nos últimos tempos sentir que a memória, concentração e atenção pioraram drasticamente, fazer os testes de Stroop, Rey Complex Figure, Digit Span, etc, e saber que estou no percentil mais alto deles todos embora tenha esta doença foi fantástico. Foi o boost que precisava para voltar a estudar com confiança. Também vou começar a trabalhar em coisinhas simples, part-time, e ganhar uns trocos. Estou a fazer formação ainda, mas com tempo lá vamos.

E é isto.

Quanto à doença, está estável. Não gosto de deitar foguetes antes da festa, mas gosto de registar os momentos em que me sinto bem, e de momento sinto-me bem. Sem pesadelos excessivos (finalmente), sem dramas constantes nem problemas contínuos.

20+10mg paroxetina, 10+10mg propanolol, 1000mg lítio, um victan e um cigarrinho ocasionalmente.

A vossa,
Mirabelle Scaffold

segunda-feira, 21 de setembro de 2015

Killing me softly

Status: paroxetina 20mg, venlafaxina 150mg, propanolol 10+10mg, lítio 800mg.

O tipo que descobriu a venlafaxina é um grande homem. Nunca antes um antidepressivo tinha feito efeito em mim, e só descobri isso quando descobri esta preciosidade. Dos 75mg passei aos 150mg, e aguentei-me como uma pessoa perfeitamente normal uns meses. Até deixar de fazer efeito.

Entrou em cena a bupropiona 150mg. E saí de cena eu. Porque nunca antes um antidepressivo me tinha dado efeitos secundários tão graves.

Voltei à venlafaxina, 225mg. Nada de melhorias, mas pelo menos estava bem fisicamente.

Hoje, neste momento, estou a ressacar. Parei a venlafaxina 225mg de um dia para o outro, e de todos os efeitos de descontinuação possíveis não houve um que me escapasse. Mais 30 dias a tomar 150mg, até ver se a paroxetina funciona.

O propanolol não funciona como ansiolítico, não se deixem enganar. Sim, baixa a tensão e o ritmo cardíaco, e sim impede a taquicardia proveniente da ansiedade. Mas nunca na vida vai ser um ansiolítico. Que venha o mexazolam ou o loflazepato de etilo outra vez.

A única coisa de que não me posso queixar é o lítio. Está na dose certa, a fazer efeito. Agora que estou estável posso afirmar que nunca na vida quis tanto estar sob o efeito dele e ao mesmo tempo ver-me livre de todas as drogas que tomo.


Isto pode tudo parecer muito técnico, mas tem as suas razões. Em primeiro lugar, estou incapaz de articular um discurso que não inclua palavrões médicos, porque as minhas emoções estão completamente baralhadas. Segundo, de que serve o meu paleio não técnico a alguém que está a sentir-se tal e qual como eu? Tomara eu saber que esta ressaca ia durar tanto tempo, e que me ia sentir tão mal. Antes estivesse deprimida mas fisicamente bem.  "Cansaço, tonturas, sensação de cabeça vazia, dor de cabeça, insónia, pesadelos, boca seca, perda de apetite, náusea, diarreia, nervosismo, agitação, confusão, zumbido nos ouvidos, formigueiro ou raramente sensação de choques eléctricos, fraqueza, suores, ataques ou sintomas tipo gripe" - tive tudo. Já lá vão 5 dias desde que começaram e hoje foi sem dúvida o pior dia.

Mas o meu futuro com a paroxetina não me parece muito mais brilhante. Merda para a disfunção sexual. Merda para as equimoses. Nunca pensei que estas coisas fossem tão más. E merda para o resto dos efeitos secundários, merda para as náuseas, merda para as tonturas, tremores, cansaço, insónias, agitação, sonolência, fraqueza, visão turva, distúrbios sensoriais, merda para tudo!

Merda para esta doença, que me está a matar lentamente.

terça-feira, 9 de junho de 2015

1 ano e tal mais tarde... (Parte 1)

...a merda continua.

Vamos a coisas práticas em primeiro, sim?

Desde os últimos posts, já lá vai coisa de um ano, passei por várias dosagens de fluoxetina, amitriptilina, fluvoxamina, mexazolam, loflazepato de etilo, topiramato, risperidona e quetiepina, cada um com os seus "magníficos" efeitos secundários, mas a maioria a fazer qualquer coisinha por mim. Passei também por vários médicos, psicólogos, psiquiatras, cada um com as suas manias, mas a maioria a fazer qualquer coisinha por mim.

Só que não.

Por volta de Outubro do ano passado, o meu novo médico, que me tinha já acompanhado durante pelo menos meio ano, disse qualquer coisa como: "Se eu já troquei os ingredientes todos ao cocktail e continuas a não ficar embriagada, então não é o cocktail que está mal feito, és tu que não és capaz de ficar embriagada". O que é o mesmo que dizer que se já tomei tudo aquilo que me deveria tratar a depressão e a depressão não é tratada, então o problema não é da medicação, sou eu que não tenho a depressão.

Doença bipolar. Ou em termos mais técnicos, Psicose Maníaco-Depressiva.

Por um lado, fiquei aliviada de perceber porque é que não estava a melhorar. Por outro, fiquei a saber que tenho uma doença considerada crónica, e que poderei estar dependente de medicação e análises mensais ao sangue para o resto da vida.

O que é certo é que parou a medicação toda, e novo tratamento: venlafaxina 75mg, loflazepato de etilo 1+1mg, lítio 400mg. E nem duas semanas depois, os sintomas depressivos com que vivi nos últimos anos passaram. E eu fui capaz de mudar a minha mentalidade: afinal é possível viver com uma doença mental. Basta ver o lado positivo das coisas. Há sempre um lado positivo para tudo, mesmo que o negativo seja muito maior. Mas há sempre algo de bom que vem com o mal. Ainda hoje mantenho essa mentalidade que ganhei em Novembro e fui amadurecendo nos últimos meses. As doses da medicação foram aumentando, é certo, mas o tratamento mantém-se, e tirando uns problemas relativamente menores que tenho tido ultimamente, pelo menos a doença está estável, e é raro ter uma crise depressiva.

Darei continuidade a este post no próximo, só para fazer consistência com o paralelo dos acontecimentos.

A vossa (regressada),
Mirabelle Scaffold

sábado, 23 de maio de 2015

O TEDxAveiro inspirou-me e ainda nem acabou

"Nos momentos de desânimo, que eram a maioria, dizia para comigo que, se alguma coisa me havia de libertar dali antes que um surto de tuberculose o fizesse, seria a literatura, e se alguém tinha comichão na alma ou nas partes pudendas, cá por mim, podia coçá-las com um tijolo."
- Carlos Ruíz Zafón, O Jogo do Anjo

Resumindo, vou voltar a escrever. Tenho de voltar a escrever.